A microbiota é um ecossistema complexo de micro-organismos que habitam diferentes partes do corpo humano, mais de 70% da microbiota se encontra ao longo do trato gastrointestinal, desde a luz gástrica até o cólon, em uma relação mútua com o hospedeiro.
No trato gastrointestinal, podem ser encontradas entre 500 e 1000 espécies diferentes de micro-organismos, com grande variabilidade, podendo-se afirmar que cada indivíduo possui sua impressão digital bacteriana. A parte distal do intestino é 90% povoada por dois filos bacterianos, os Bacteroidetes e os Firmicutes.
A microbiota desempenha um papel na regulação de vários mecanismos bioquímicos e fisiológicos por meio da produção de metabólitos e substâncias. Graças à capacidade limitada dos mamíferos em digerir polissacarídeos, eles se tornam o principal substrato para manutenção, proliferação e são a principal fonte de energia para micro-organismos no cólon.
Por meio da degradação de polissacarídeos, os Bacteroidetes produzem ácidos graxos de cadeia curta (SCFAs), principalmente acetato e propionato, e os Firmicutes produzem butirato. O acetato é absorvido e depois transportado para o nível periférico, onde atua como substrato para a síntese do colesterol, enquanto o propionato, absorvido pela circulação portal, participa ativamente da gliconeogênese.
O butirato, como principal fonte de energia para os colonócitos, demonstrou aumentar a sensibilidade à insulina em camundongos e tem uma ação anti-inflamatória que foi recentemente investigada como possuindo uma possível ação “antiobesogênica”. O butirato promove a estabilidade da herança celular, favorecendo a conversão de células com fenótipo neoplásico em não neoplásico.
A produção de SCFAs também é estimulada pelo metabolismo anaeróbico de substratos proteicos e/ ou peptídicos (putrefação), que geram substâncias potencialmente tóxicas como amônia, aminas, fenóis, tióis e indóis.
Os SCFAs, resultantes da atividade enzimática da microbiota sobre os carboidratos não digeridos, exerce as seguintes ações biológicas:
- Modulação glicêmica, geralmente com efeito hipoglicêmico.
- Ação na homeostase da glicose: efeito inibitório da glicólise e estimulação da lipogênese ou gliconeogênese.
- Controle inibitório da produção excessiva de colesterol, por meio da ação direta sobre a síntese das enzimas envolvidas em sua produção.
- Regulação da saciedade por meio de peptídeos, como a leptina, envolvidos em seu controle. Em particular, foi demonstrado que os SCFAs diminuem a ingestão aguda de energia sem aumentar a concentração do peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1) ou do peptídeo YY (PYY) em humanos e roedores.
- Regulação da atividade cinética intestinal, transporte de fluídos e ação mucoprotetora.
- Ação anticancerígena
- Ação anti-inflamatória
Há evidências crescentes de que qualquer modificação na composição da microbiota pode ter um impacto negativo em suas funções fisiológicas. Para isso, existem dois termos-chave: eubiose e disbiose.
O termo eubiose refere-se a uma condição de equilíbrio qualitativo e quantitativo entre as diferentes espécies de micro-organismos que compõem a microbiota e que garantem uma produção correta dos metabólitos e substâncias necessárias ao bom funcionamento do nosso organismo.
O termo disbiose indica uma alteração na composição e função da microbiota, com dois resultados negativos possíveis: primeiro, a produção incorreta de todos os metabólitos e substâncias essenciais para o desempenho das funções fisiológicas. Em segundo lugar, o aumento da produção de metabólitos prejudiciais.
Esse desequilíbrio e modificação na composição da microbiota podem levar a diferentes doenças, incluindo doenças metabólicas, como obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares.
Este texto foi escrito por: Angelica Quinteros
Referência:
Pascale, A., Marchesi, N., Marelli, C. et al. Microbiota y enfermedades metabólicas. Endocrine 61, 357–371 (2018). https://doi.org/10.1007/s12020-018-1605-5.